"É
fácil amar o outro na mesa de bar, quando o papo é leve, o riso é
farto, e o chope é gelado. É fácil amar o outro nas férias de verão, no
churrasco de domingo, nas festas agendadas no calendário do de vez em
quando. Difícil é amar quando o outro desaba. Quando não acredita em
mais nada. E entende tudo errado. E paralisa. E se vitimiza. E perde o
charme. O prazo. A identidade. A coerência. O reb
olado.
Difícil amar quando o outro fica cada vez mais diferente do que
habitualmente ele se mostra ou mais parecido com alguém que não
aceitamos que ele esteja. Difícil é permanecer ao seu lado quando parece
que todos já foram embora. Quando as cortinas se abrem e ele não vê
mais ninguém na plateia. Quando o seu pedido de ajuda, verbalizado ou
não, exige que a gente saia do nosso egoísmo, do nosso sossego, da nossa
rigidez, do nosso faz-de-conta, para caminhar humanamente ao seu
encontro. Difícil é amar quem não está se amando. Mas esse talvez seja,
sim, o tempo em que o outro mais precisa se sentir amado. Eu não
acredito na existência de botões, alavancas, recursos afins, que façam
as dores mais abissais desaparecerem, nos tempos mais devastadores, por
pura mágica. Mas eu acredito na fé, na vontade essencial de
transformação, no gesto aliado à vontade, e, especialmente, no amor que
recebemos, nas temporadas difíceis, de quem não desiste da gente."
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